domingo, 22 de maio de 2011

Pastoral da Sobriedade completa 12 anos em Rondonópolis

Riso fácil, mãos que não param e uma conversa boa de se escutar. É possível passar horas ouvindo suas histórias. Apesar disso, não é possível lhe revelar o nome. Ele tem 35 anos, atende pelas de iniciais M. A. e luta para se curar de uma doença chamada “dependência química”, algo que acomete milhões de pessoas no mundo. O anonimato é uma forçada defesa contra o preconceito e a incompreensão espalhados pela sociedade e reverberados até mesmo por vários meios de comunicação.

“Tô vivo por causa dela”

M. A. é uma das pessoas auxiliadas pela Pastoral da Sobriedade, que completa hoje (quinta-feira, 12) seu décimo segundo ano de existência em Rondonópolis. O contato foi possível por conta de um ex-patrão, que percebeu sua mudança de comportamento no serviço e, por ter um filho dependente, logo identificou a causa do problema.

Apesar da pouca idade, a história de M. A. é marcada por dramáticos momentos. Ele vive no “mundo das drogas” desde os 12 anos e teve no desregrado ambiente familiar o primeiro estímulo para adentrar este universo. Primeiro, foi a bebida alcoólica. Depois, as ilícitas pasta base e cocaína. Ele nasceu e atualmente mora em Rondonópolis, mas passou 24 anos em Várzea Grande (MT). Aos 16 começou a se prostituir e aumentar o consumo de álcool.

M. A. foi encaminhado para quatro clínicas de recuperação. O último tratamento terminou em fevereiro deste mês. Ele afirma não usar drogas hoje em dia, porém sabe da possibilidade de recaída. Vez por outra aparece na sede da Pastoral, situada na rua 13 de maio, bairro La Salle, para conversar com as agentes e ver em que pode ser útil. Sempre que pode dá testemunhos em grupos de auto-ajuda (de familiares e dependentes). “Tô vivo por causa dela (da Pastoral). Ela não me deixou. Com ela eu aprendi que enquanto há vida, há jeito”.


Ser agente em família

O empresário Edson Alves Martins Mizuguti, de 45 anos, e a historiadora Aparecida Moreira Lima Martins, de 48, atuam como agentes da Pastoral da Sobriedade em Rondonópolis desde o final de 2007. Trabalhar diretamente com dependentes químicos e seus familiares foi um gesto cristão concreto do casal diante do que via todos os dias nas proximidades de onde mora. “A gente assistia a muitas pessoas, principalmente jovens, usarem drogas ali na região do Cais. Algo muito triste ver jovens bonitos se definhando. E também temos dois filhos adolescentes. Pensamos no que fazer e decidimos participar da Pastoral”, relata Mizuguti, chamado de Edson pelos demais agentes.

Edson, agente da Pastoral.
Ele e a esposa coordenam grupos de auto-ajuda, encaminham dependentes a comunidades terapêuticas, fazem promoções para levantar dinheiro para a Pastoral, quando podem doam do próprio bolso. O trabalho voluntário propicia um diálogo aberto com os filhos (Rafaela, de 18 anos, e Felipe, de 17) sobre as drogas. “Eu cito exemplos de pessoas que passam pelo flagelo da dependência química. Eles ouvem, falam, lêem livros a respeito do tema, assistem palestras”.


Aceitando a co-dependência

Por vários anos a administradora Ana Angélica Falbo Tonello Moreno, de 41 anos, fez questão de esquecer a existência de um irmão dependente químico em razão dos transtornos causados à família. Ele está preso em São Paulo há quatro anos e meio por uma série de roubos e furtos. “Tudo para comprar droga”. O afastamento de Ana em relação ao irmão foi tão intenso quanto a vontade de resgatar o amor por ele. A transformação ocorreu de modo inesperado, após dois fatos. “Em 2009 meu irmão (hoje com 38 anos) sofreu um acidente na prisão e fiquei mexida com isto. Depois de um tempo, em 2010, fiz uma visita para ele. Foi a primeira vez que nos vimos após 10 anos”.

Ainda no passado Ana ouviu um apelo da irmã franciscana e vice-coordenadora diocesana da Pastoral da Sobriedade, Maria Vieira Queiroz, de 52 anos, após uma missa na igreja Nossa Senhora Aparecida, no bairro Vila Aurora. Ela convidava a comunidade a participar da entidade. “Pensei: ‘Vou lá ajudar porque tenho um caso de dependência química na minha família. Mas chegando lá vi que eu é que precisava de auxílio.” Ela descobriu que era uma co-dependente, justamente por ser irmã de alguém viciada em drogas ilícitas. “Só chorei no começo. Mas depois admiti minha condição e hoje estou me capacitando para ser uma agente”. Ana está feliz porque o irmão poderá ficar livre em breve. “Quero que ele more na minha casa”. O esposo e os filhos a apóiam.


“Eu sempre vivia na dependência de alguma coisa”

Formada em Educação Física, Lúcia Zonta, de 48 anos, conheceu a Pastoral da Sobriedade no ano passado na condição de co-dependente e hoje permanece no local por outro motivo. Ela foi indicada por uma psicóloga para saber lidar com o ex-companheiro, viciado em drogas. No entanto, no contato com a Pastoral, Lúcia teve uma noção mais ampla do conceito de dependência e percebeu que precisava fazer fortes mudanças na vida. “Eu sempre vivia na dependência de alguma coisa. Dos meus filhos pra ser feliz. Do companheiro pra ter alegria. Do trabalho pra ter sucesso. E vi que não era assim”. Foi aí que o relacionamento com o namorado terminou e a lida com os filhos passou a fluir melhor.

Lucia em Curitiba
Hoje em dia ela é agente da Pastoral. Mês passado participou em Curitiba de seu primeiro curso de formação e dá os passos iniciais para a construção de um grupo de auto-ajuda no bairro Jardim Atlântico. Entusiasmada, já faz planos para no ano que vem: “Sou funcionária pública estadual concursada e quero voltar a dar aulas. Tenho certeza que assim poderei contribuir mais com minha comunidade na luta pela conscientização contra as drogas”.

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